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O Despertar da espiritualidade após tomar Ayahuasca
Tomar Ayahuasca é tido milenarmente como uma morte e renascimento, especialmente para quem faz da forma certa, ou que se afinize com a medicina ancestral. Sim, eu já tomei Ayahuasca (e muito). Como ja falei aqui fui criado numa família católica e só tive acesso ao espiritualismo e explicação da mediunidade lá pelos dezoito anos e lembro exatamente como isso começou.
Num domingo de manhã acordei cedo e fui visitar minha avó, na porta estava o jornal que eu peguei e entreguei à ela não sem antes ver uma revista dentro, que era uma edição do próprio jornal, e na capa vinha escrito: Ayahuasca, o neo-xamanismo e a espiritualidade. Na capa havia a foto de um xamã de chapéu também, muito legal.
Fiquei bastante curioso e mexido já na capa, havia alguma coisa ali que eu precisava, e antes mesmo de ler o conteúdo pedi a revista. Ali havia de forma um tanto sensacionalista e resumida, informação sobre vários grupos e formas diferentes do que chamava de neo-xamanismo.
Era uma época muito complicada para mim e eu estava totalmente perdido. Sentia coisas que não conseguia explicar, canalizava vozes que eu acreditava se tratar do Arcanjo Miguel e captava informações de imagens religiosas. Eu estava no primeiro ano da faculdade de Psicologia (porque me achava maluco), não tinha amigos e tinha terminado o primeiro relacionamento amoroso que começou errado e terminou pior ainda. Me sentia estranho, bobo e incapaz.
Era uma época que eu queria “me encontrar” ou encontrar qualquer coisa que pudesse me levar à mim, ou alguma coisa com que eu me identificasse, porque não havia nada. Achei que tomar Ayahuasca fosse algo um tanto radical e tentei começar por rituais menores para ir aos poucos já que não conhecia nada fora do catolicismo. Fui à pequenos rituais xamânicos e neo-xamânicos, indígenas e celtas, e não me enquadrei em nada. Eram grupos de gente jovem que compartilhavam suas crenças que me eram estranhas. Era confuso e chato.
Nessa época tive uma experiência com Salvia Divinorum, que então era legalizada no Brasil e se comprava na internet com enorme facilidade, inclusive em extratos potencializados. Minhas experiências com sálvia foram péssimas; tive visões de seres deformados e espíritos com asas ligados à parte sexual, eram visões que só me perturbavam e não tinham qualquer significado, a planta me mostrava mas não me instruía, a Salvia Divinorum claramente não era minha aliada.
Bom, como já havia passado por rituais vazios e até pela Sálvia, decidi que uma última chance à algo mais “espiritualista” e menos ligado à uma única tradição seria necessário, e eu iria tomar Ayahuasca. Decidi intuitivamente por um dos locais que a revista indicou, liguei para lá, na época era mais fácil e aberto, e marquei de ir. Me foram dadas algumas instruções, por exemplo, três dias de jejum de carne e abstinência sexual, o que não foi particularmente um grande sacrifício.
Na noite de um dia três de setembro eu dei meu primeiro passo de poder e individuação na vida e saí de casa com minha carteira de identidade, sem explicar nada à ninguém, apenas dizendo que iria dormir fora para ver um grupo “espírita” e deixei um telefone anotado num papel, e fui tomar Ayahuasca naquele ritual.
A casa era fantástica, havia imagens de muitas tradições diferentes o que me deixou maravilhado e aterrorizado, porque eu sabia que existia mais do que o catolicismo, e que não, não podiam ser diabos apenas. Imagens de deuses hindus, budistas, afro-brasileiros, entidades indígenas, exus e deuses egípcios. Quadros de deuses, mestres de diversas linhagens da ayahuasca, desde Santo Daime, União do Vegetal até a Barquinha (que eu não conhecia, só havia ouvido falar). O local era mágico. Muita coisa me foi explicada na palestra dada pelo sacerdote do local, um ser muito interessante também.
Pedi uma dose profunda. Minhas primeiras visões foram terríveis. Toda a sensação de mediunidade e terror da infância, espíritos sofredores, espíritos sugadores de energia sexual e tudo que eu via com frequência em todo lugar apareceram concentrados, e as informações foram sendo processadas. Eu era médium. Eu via mais do que os outros, e sentia mais que a maioria. Minha verdadeira face me foi mostrada. Informações foram passadas aos borbotões, a Ayahuasca me aceitou e me tomou como aluno, não sem antes me testar e amedrontar por umas boas quatro horas de tormento e luta que pareceram infinitas.
Depois disso vi meu orixá, meu animal de poder e de proteção, vi muitas coisas, minha própria alma entre elas. Vi uma das minhas encarnações, a que mais influencia em minha vida agora, e aprendi que toda vida tem uma outra vida que trazemos mais na influência ou na memória do espírito, sabe-se lá o porquê, e nem sempre é a mais recente.
Tive dificuldade em processar a experiência pelos dias que se passaram, e comecei a frequentar aquela casa. Tomei Ayahuasca por cinco anos numa base pelo menos quinzenal.
Tenho muito amor e gratidão à mestra Ayahuasca, que possibilitou meu contato comigo próprio em primeiro lugar, e então com toda a minha trama espiritual, guias, guardiões e entidades. Meus irmãos e amigos espirituais. A Ayahuasca também desenvolveu minha mediunidade, limpando meu canal mediúnico de anos de repressão e desinformação.
À mestra Ayahuasca, meu amor, gratidão e devoção. Que um dia eu te possa fortalecer em tuas egrégoras como fez em minha vida nesta encarnação.
Ayahuasca não dá de graça, dá por graça, e por isso não é um remédio universal à ser dado para todos. Ayahuasca te aceita ou não (como a Salvia não me aceitou), e eu não sei se é uma questão de natureza, de vibração, egrégora ou de afinidade, talvez tudo isso e algo mais.
Ayahuasca não é alucinógeno
Simplesmente porque não é recreacional, não é químico nem faz ver de olhos abertos coisas que não estejam ali de alguma forma. Não adianta tomar Ayahuasca com amigos, na rua ou para curtir um barato, tudo que se obtém é desperdício de força e imagens confusas para quem não tem sensitividade. Além das sensações físicas de enjôo, náusea e tontura que podem ser intensas.
Ayahuasca não enlouquece ninguém, não vicia e tem alguns milhares de anos de experiência nas américas e especialmente no Brasil. É um patrimônio espiritual brasileiro, não exclusividade nossa, mas nossa grande aliada.
Tomar ayahuasca não causa alucinação visual, ela causa mirações, e sem concentração pessoal mesmo em altas doses no máximo provoca sonhos lúcidos com imagens psicodélicas. É preciso se concentrar e chamar pelas forças certas para que venham e interajam conosco, e é disso que se trata as diversas escolas de ayuahuasca com egrégoras de espíritos, ensinamentos e trabalhos diferentes.
Espíritos e egrégoras da Ayahuasca
Como a Ayahuasca é um ser natural, uma força imensa da natureza, ela traz consigo espíritos naturais os chamados elementais, e também os chamados encantados que são seres híbridos de humano com elementos, e ainda os espíritos desencarnados de poder, que podem ser chamados de entidades, guardiões e ancestrais.
Eu particularmente tenho muita conexão com estes seres, e eles são de excelente natureza, muito abertos e trabalhadores da senda da sabedoria e do esclarecimento, então são seres geralmente de bom trato, apesar de muitos serem também severos.
Existem diversos tipos de linhagem. Algumas delas, as mais presentes são:
– Xamanismo:
A linhagem mais tradicional e lógica. Cada tribo tem sua própria forma de trabalhar com a Ayahuasca, seus costumes, ícaros e rezas, bem como forças diferentes que vem do chá. Os Yawanawá e Huni Kuin são famosos por realizar estes rituais de forma bastante aberta, mas diversas tribos tem feito assim hoje em dia.
-Santo Daime:
Cada casa tem sua regra, geralmente seguem A Doutrina de Padrinho Sebastião e Mestre Irineu. Tem fortes conexões com o catolicismo, Santa Maria e muito sincretismo.
– UDV: União do Vegetal
Seguem o ritual deixado por Mestre Gabriel. Geralmente usam cânticos que nomeiam por Chamados para chamar a força. Ouvem música popular após chegar a força da Ayahuasca que chamam de borracheira. É algo mais popular e pessoal, menos doutrinário e cristão.
– Barquinha:
A Barquinha tem vários sectos, geralmente vindos de Frei Daniel e madrinha francisca, e outros mestres juremeiros também. Eu particularmente gosto muito da Barquinha. A maioria das casas utiliza apenas a Ayahuasca mas também há as que trabalham com a Jurema sagrada. Algumas barquinhas tem influência mais cristã, outras tem uma influência mais do catimbó e de cultos afro-indígenas brasileiros. Chama pelos encantados e espíritos híbridos, além de entidades.
– Umbandaime:
Mistura de umbanda com ayahuasca, mas muitas vezes puxando também para a linha da Jurema.
– Arca da Montanha Azul:
Onde começou meu caminho. Traz reunidas em si todos os tipos de trabalho com a Ayahuasca, e na época em que eu fui, foi a que eu mais me identifiquei e com a proposta mais universalista também, tem uma incrível variedade de egrégoras e espíritos que trabalham com ela e que ali são bem vindos.
Tomar Ayahuasca não é para todos!
Sim, eu sei que a maioria das pessoas que trabalha com a Ayahuasca, de indígenas à padrinhos e sacerdotes, são quase unânimes em dizer que todos podem tomar a Ayahuasca, e creio que isso se deva ao fato de a Ayahuasca não ser nociva nem provocar males permanentes para ninguém, mais do que ao fato de que qualquer pessoa que tome Ayahuasca vá ter benefícios. Em minha experiência de anos sei que não é bem assim.
Como eu mesmo me dei muito mal com a Sálvia e com outras medicinas, e me dou muito bem com a Ayahuasca sei que não é toda força da natureza que vai nos instruir e proteger.
Levei meu irmão para tomar Ayahuasca no meu terceiro ano de experiência. O que para mim era ótimo, não foi tão proveitoso para ele, que terminou voltando para a Igreja católica, com uma mente mais aberta, porém ainda assim tivemos experiências totalmente diferentes em intensidade e revelação.
Já vi gente se curar de vícios terríveis com a Ayhuasca, curar de depressão e psicose também, e gente que teve até problemas físicos sanados, isso eu vi. E sim, eu recomendo a Ayahuasca como experiência para toda pessoa adulta que seja capaz de tomar consciência de si, de se responsabilizar e que não esteja sob medicamentos psiquiátricos, porque a interação com remédios costuma ser problemática, mais até do que com o álcool.
Se você deve tomar Ayahuasca? Bem, essa é uma decisão sua. Para mim fez bem, e para muitos outros espiritualistas também (nem todos). A Ayahuasca foi meu pontapé inicial, foi o encontro comigo mesmo e o verdadeiro início da minha encarnação, foi como receber um pouquinho da consciência da minha alma novamente, e começar a encarnar aos poucos. Muitas vezes estamos neste estado de sonolência mental, inconscientes, e os enteógenos podem ser uma ajuda.
Enquanto for uma ajuda e uma guia, você estará em segurança. À partir do momento em que for visto como “viagem”, “experimento psicodélico”, pouca coisa boa pode vir daí. Portanto se for tomar Ayahuasca fica a frase de Don Juan para Castaneda:
“Alguém que vai para o Poder e o Conhecimento deve ir como quem vai para a guera; bem desperto, com respeito, com medo, e com uma segurança absoluta. Ir para o conhecimento ou para a guerra de qualquer outra maneira é um erro, e quem o cometer há de se arrepender.”
Obs.: Eu fui apavorado, mas quase tudo que eu fiz e faço de bom em minha vida foi com uma boa dose de medo e pavor nos bastidores da mente. Vá sabendo que na pior das hipóteses você descobre algo que não funciona com você, mas você volta sim, ninguém nunca ficou preso nos efeitos por mais do que horas.