Lucifer: Diabo ou o Anjo da Luz?

A verdade sobre Lucifer

  • Lucifer não é o diabo.
  • A confusão imposta na imagem de Lucifer
  • Tradução corrupta consolida o poder da igreja.

Esqueça a imagem de Lucifer como o demônio dos cristãos fundamentalistas, para os gnósticos ele é essencial na iluminação.

Mesmo após tanto esforço e polêmicas envolvendo Helena Blavatsky, Rudolf Steiner, diversas linhas gnósticas (também cristãos) e outros que apresentaram versões esotéricas de Lucifer ao longo da história, ainda hoje a imagem de Lucifer, para a imensa maioria das pessoas, é herança de séculos de cristianismo, repressão e dogmas sem sentido.

Se a fé ocidental tem origem nas imagens de santos dedicados, mártires corajosos e guerreiros conquistadores, os dogmas que controlam aqueles que professam esta fé tem origem no medo, e o medo precisa de uma ameaça, e assim foi criado o adversário em forma de entidade, o diabo. A imagem do diabo como ser chifrudo e monstruoso que nos tentava para a sexualidade e os prazeres mundanos começou a surgir no século XI apenas, iniciando uma era de trevas morais, científicas e religiosas para a humanidade.

Para aumentar a imagem do mal, nomes e personalidades foram sendo acrescentados para personificar os medos de inimigos, demônios monstruosos e promessas de tortura eterna. Não que não existam seres espirituais diabólicos e muito feios, mas pouco tem a ver com as fantasias cristãs e menos ainda associados à Lucifer.

A criação diabólica do inimigo era associada à todo tipo de deidade de outras religiões ou outras terras. Isso não era feito apenas por cristãos, mas por grande parte de adoradores de um deus quando tomavam as terras ou simplesmente, influenciavam a cultura dos outros. A imposição genética e religiosa sempre foi considerada espólio de guerra, e nem por isso deixa de ser uma violência e um absurdo.

É através da sucessão de impérios cristãos e o poder do clero que todo tipo de deidade é associada ao “diabo”, até mesmo daemon (espírito em grego) passou a ser um plural para diabo. O nome de Lucifer seria igualmente colocado nessa barca, já que ele estava lá, escrito solto e estranho na bíblia, se misturando com diversas deidades que atendiam por este nome, judaicas, romanas, caanitas e gregas (phosphorus e hesperus).

Quando estudei a “Kaballah” descobri que os cabalistas, que estudam a Tanakh, não tem qualquer tipo de fé no “diabo”, que ele simplesmente não existe neste sistema. À princípio fiquei curioso, porque como leigo eu achava que a Torah é a base do “Antigo Testamento” da bíblia, e Torah são os primeiros cinco livros da Tanakh; acontece que não é bem assim. A única vez que “Lucifer” aparece na Tanakh, os livros sagrados do sistema cabalístico judaico, base do esoterismo ocidental e origem (depois de muitas corrupções) do que consideramos bíblia, é no livro do profeta Isaías. Na bíblia ocidental se trata de Isaías 14:12

  • “Como caíste do céu, ó estrela da manhã, filha da alva! Como foste lançado por terra, tu que debilitavas as nações!” –

Se eu coloquei Lucifer com aspas é porque este nome não existe nos livros cabalísticos, e o nome é simplesmente הֵילֵל בֶּן־שָׁחַר, o que se pronuncia Hēlēl ben Shāḥar. Somente milhares de anos depois dos manuscritos em hebraico é que aconteceram dois eventos que uniam a igreja e o império dominante na Europa que originariam esta passagem mal traduzida como o início de uma grande farsa:

  • Concílio de Nicéa no ano 325, que definiu Jesus como o Deus monoteísta para os católicos e a religião católica como a única fé aceitável nos reinos do império de Constantino.
  • Concílio de Hipona no ano 393, onde a bíblia foi compilada, os livros foram escolhidos à dedo para sustentar basicamente as decisões do concílio anterior, em detrimento de diversos outros livros (do antigo e novo testamento) hoje considerados apócrifos. Foi assim que esta passagem do profeta Isaías veio a ser traduzida para o latim no século quinto por péssimos letristas que realizavam a tradução literal quando não conheciam o simbolismo por trás da outra língua, foi assim que Helel Ben Shahar, a “Estrela da manhã” ou “luz do amanhecer”, foi traduzido como Lucifer.

Eu já fui tradutor e falo quatro línguas, entre elas o chinês mandarim. É muito difícil explicar algumas coisas para minha esposa, chinesa, quando se trata de uma expressão típica do português ou quando é algo engraçado para nós brasileiros; a mesma dificuldade existe quando se fala algo em chinês para ser explicado à algum ocidental, algumas coisas simplesmente NÃO PODEM SER TRADUZIDAS. A tradução ao ignorar o sistema de comunicação e imagem da cultura em questão, da época em que foi escrito, dá um sentido totalmente corrupto para o que foi traduzido.

Lucifer: Imagem capa da revista teosófica batizada em seu nome. Para Helena Blavatsky, Lucifer era o salvador da humanidade, trazendo a luz do conhecimento mesmo após ordens expressas de outra deidade para nos manter na ignorância.

Então afinal Lucifer é o diabo ou o anjo da luz? O diabo como criação cristã é tudo aquilo que é mal, e junto com isso o que sai dos dogmas e das crenças deles, principalmente as crenças dos outros. Por isso NÃO, Lucifer não é o diabo dos cristãos descendentes do catolicismo, e tampouco é anti-cristão, até porque os próprios cristãos fizeram seu nome permanecer tão famoso e envolto em mistérios por milênios, sem na verdade receber sequer curiosidade por parte do Anjo da Luz, já que ele não se interessa por pessoas de intelecto baixo ou domináveis pelo medo.  

O fato é que Lucifer passou a aparecer na bíblia cristã tirado de contexto, já que Isaías se referia ao Rei da Babilônia, que representava o rei do velho mundo, das coisas antigas, dos deuses dos “outros”, cujo império estava também em declínio. Este erro de tradução associou o rei da Babilônia à Lucifer, e este à imagem de שָטָן ou Shatan, conhecido por Satanás, que todo cabalista traduz como “o desafio”, “o que acusa” e não como uma entidade moradora do inferno que se interessa na sua perdição, mas sim como um conceito abstrato a ser compreendido, individualizado (já que cada um tem seus próprios adversários) e superado por dentro de si (único local onde pode haver superação).

O diabo cristão foi uma criação para assustar, controlar e influenciar as pessoas durante muitos séculos, e foi bastante bem sucedido já que muitos espíritos encarnados e desencarnados, humanos e naturais, com más intenções e ambições desmedidas utilizaram destas máscaras cristãs para agir ou se acusar de alguma coisa. Isso nada tem a ver com o Anjo da Luz, que Helena Blavatsky dizia ser “o único deus deste mundo”, ela que era estudiosa do cristianismo gnóstico, onde Lucifer é apresentado como o verdadeiro patrono da humanidade, aquele que trouxe a sabedoria e a consciência para o ser inconsciente criado pelo demiurgo, o ser humano; símbolo este praticamente repetido na história grega de Prometheus.

O destino do mundo com certeza teve parte neste sacrifício onde o Anjo da Luz é transformado em Bode (literalmente) expiatório na idade média. Lucifer ousou roubar a luz do conhecimento e iniciar o ser humano na árvore da vida. A história que se repete no mito de Prometheus sobre o começo da humanidade diz que vendo que nada sobrou para o ser humano dos dons divinos que foram dados à seres míticos e até animais, Prometheus rouba o fogo do conhecimento e transforma o ser humano no ser capaz de alcançar a iluminação para a alma. Prometheus viria a ser “devidamente” punido por isso.

Particularmente, eu acredito e canalizo Lucifer como entidade e deidade, como o Anjo da Luz, porém ele é mais do que isso: Lucifer é um mistério da natureza, dando nome à exus, à conceitos esotéricos, à todo um tipo de seres angelicais para além da imagem-máscara de adversário da igreja católica.

Em outros posts vamos explorar cada uma destas máscaras e desmistificar o Anjo da Luz, de forma à sair das trevas do dogma e do medo, e enxergarmos a luz que pode nos guiar por dentro de nossa própria escuridão, o único lugar onde podemos ter iluminação. Afinal já dizia C.G. Jung: “Ninguém se torna iluminado por imaginar imagens de luz, e sim por tornar conscientes as trevas interiores”, e não existe escuridão pior do que a união de ignorância, medo e preconceito.

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