Continuando nossa categoria de magia oriental com mais um capítulo dedicado à Magia Tailandesa que introduzimos aqui. Dessa vez para falar de um dos meus mestres preferidos, ou talvez o meu preferido, Ajarn Bes (t).
Você vê aqui:
Ajarn Best – mago milagroso que desafiava a física
Nativo de Chiang Mai, norte da Tailândia, Ajarn Bed Worapon ou Ajarn Bess Worapon, era carinhosamente chamado de Ajarn “Best” por seus mestres e discípulos, por ser alguém que tudo que fazia, fazia melhor do que aquele com quem aprendeu.
A data de nascimento de Ajarn Best é uma incógnita, sendo que alguns dizem ter sido em 1984 e outros apenas em 1990. Essa desinformação é proposital. O próprio Ajarn Best era bastante precavido contra feitiços e não revelava a data de nascimento para ninguém.
Ele era muito intuitivo. Neto de Ajarn Nan Jun, outro mago secular, desde cedo ele quis aprender sobre magia e dharma começando a meditar quando ainda era criancinha.
Logo que entrou na adolescência foi monge por dois anos, o que na época era comum. Tendo abandonado a ideia de ser monge aos 18 anos quando começou a estudar magia com mestres lendários da época como Phor Sala Tan e Luang Phor Moon.
Foram estes dois mestres, aliás, que reconheceram Ajarn Best como a encarnação de uma entidade-deidade do sistema Lanna de magia, do norte da Tailandia.
Os mestres logo viram que ele tinha uma conexão muito fácil e natural com o mundo espiritual e começaram a exigir a presença dele, mesmo que muito jovem, nas cerimônias de consagração de seus talismãs e trabalhos particulares.
Ajarn Best era um mago necromante, e era exímio na fabricação de talismãs utilizando restos mortais de pessoas, o que na época era não apenas legalizado como algo de curiosidade pública. Os talismãs que ele vendia tinham a renda toda destinada para a criação e manutenção do Samnak (templo) Woraphon.
Especialmente quando passou a ter discípulos e a fundar seu próprio templo, o Samnak Woraphon, muitos queriam fazer dele um homem famoso. Ajarn Best sempre recusou.
Ele detestava exposição, mídia e multidões, e negava totalmente ser famoso por seus dons. Dizia que tinha vindo à terra para contribuir com algumas coisas e voltar para o plano espiritual rapidamente. Na época, ninguém entendia que ele estava falando em sentido literal.
Era uma outra época, uma outra Tailândia. Não havia o imenso mercado de talismãs para o resto da Ásia; ainda não era moda, e os talismãs eram feitos geralmente para nativos, em pouca quantidade e sempre pessoalmente.
Os talismãs, óleos e magias feitos por Ajarn Best acabavam por vezes antes mesmo de serem feitos. Todo mundo queria algum.
A primeira vez que tive contato com algo dele foi há muitos anos atrás, provavelmente em 2016-17.
Conheci um outro estrangeiro que havia morado na Tailândia por seis anos, e que dizia estar vendendo um talismã feito à mão por Ajarn Best (que fazia todo os talismãs à própria mão, coisa comum naquela época e rara hoje em dia, em que as produções de talismãs chegam aos milhares por peça e envolvem os discípulos dos mestres e até fábricas).
Este estrangeiro que eu não me lembro de onde vinha, dizia que o talismã era um Paya Kao Kham (deus da masculinidade), e que tinha uma força enorme de atração do sexo feminino, que quando ele usava as mulheres se atiravam em cima dele. Que era algo fenomenal.
Confesso que na época eu sabia muito pouco sobre Ajarn Best e a obra dele; o fato de ser um mago jovem, bonitinho e com fama de milagreiro não me impressionava, e eu nem sabia que muitos dos seus talismãs já eram falsificados pois já havia mais de quatro anos da morte dele.
Achei no entanto muito estranha a atitude do colega, de que alguém “vendesse” tal poder depois de testá-lo. Será que ele havia se cansado de transar com mulheres lindas e agora queria seiscentos dólares para beber e esquecer disso?
Fora que na Tailândia, principalmente naquela época, ser um gringo branco tornava a pessoa tão alvo do turismo sexual quanto qualquer outro que fizesse parte dele, e as meninas, de fato, lutavam para “trabalhar” para um desses, especialmente se pagassem em dólar.
Mesmo as moças que não eram profissionais podiam sustentar a família inteira na época com um namorado americano ou europeu. Essa era a situação da Tailândia na época. Continua em alguma parte sendo assim, mas nem de longe como já foi.
O que me deixaria boquiaberto é se ele conseguisse o mesmo efeito na China rica, com meninas que não davam a menor para o que existia além da fronteira, já que não precisavam.
O fato é que não comprei. Me arrependo um pouco, mas a possibilidade de se tratar, já naquela época, de um talismã falso e não de um trabalho de Ajarn Best era imensa, tanto pela quantidade de “fakes” no mercado quanto pela atitude suspeita de quem “cansou de ser alvo do desejo das mulheres”.
Os talismãs de Ajarn Best hoje são vendidos por o que se pode converter em alguns MILHARES de reais, cada um. Eles são realmente efetivos, alguns já trazem um cheiro estranho, especialmente pelo uso de materiais necromânticos.
Eu, em particular, estou negociando há alguns meses para adquirir este, um talismã raro que traz fios de cabelo de Ajarn Best, juntamente com alguns materiais sagrados utilizados por ele.
Este tipo de talismã é muito comum na Tailândia e em toda a Ásia, na China são os mais famosos, se chama 自身牌, e os chineses gostam por geralmente representar um monge ou mago do passado (e os do presente também), com materiais valiosos de trabalho dele na parte de trás do talismã. Alguns trazem até o sangue dos que estão vivos, ou cinzas dos que passaram. Na China se diz que esse tipo de talismã é o melhor para atrair prosperidade.
Treinamento old school
Com vinte anos de idade, sendo um rapaz ainda, Ajarn Best viajou sozinho por diversos locais da Tailândia para aprender com mestres de magia; ele se tornou um peregrino nesta época.
Esta fase de aprendizado e peregrinação solitária não se resumiu à Tailândia, tendo ele ido à Burma, Laos e ao Camboja para aprender e dominar sistemas de magia diferentes.
O treinamento incluía noites sem dormir em cemitérios, trabalho necromântico, se expor à animais selvagens para comunicação e invencibilidade (com tigres e cobras), jejuns, dias inteiros de meditação e era no mínimo exaustivo e impensável para nós ocidentais já naquela época (isso já era no fim da primeira década do nosso século).
Algumas curiosidades de Ajarn Best
Ajarn Best fazia o seu óleo de encantamento utilizando 108 tipos diferentes de plantas, óleo corporal necromântico (o temido Nam Man Prai) e….ele mesmo. Sim, ele simplesmente sentava dentro da panela e se fervia junto com o óleo, o que era visto por todos os presentes.
Outra wicha (magia) milagrosa de Ajarn Best era o Khong Grapam, o que significa invencibilidade ou invulnerabilidade em Thai. Após realizar a magia e tatuar algum símbolo na pessoa, ele testava a eficácia, simplesmente esfaqueando a pessoa para ver se a faca causaria algum tipo de perfuração. Nunca causou mais que um arranhão na pele. A magia de Ajarn Best era simplesmente incrível.
É curioso que não haja quase nada sobre Ajarn Best em inglês, e este é o primeiro artigo sobre ele em português, e eu sou o primeiro que apresenta a magia tailandesa em língua portuguesa.
A famosa foto de Ajarn Best de óculos escuros, que eu vi em 2017 pela primeira vez, pode parecer retratar um mago playboy. Os óculos escuros faziam parte de uma prática de magia de Burma. Quem batia foto com ele ao final do treinamento era para demonstrar que havia dominado o sistema mágicko de poder do olhar e influência, por isso utilizava os óculos escuros por determinado período e batia foto com ele.
Ajarn Best foi o mais novo da história a dominar esta magia e tirar a foto igual ao seu primeiro mestre, Luang Phor Moon, muito mais velho.
Ajarn best era considerado um dos cinco tigres do norte. Isso é, na Tailândia, o título de mestre tigre (Suea) é dado para quem dominou o wicha suea saming (magia de invencibilidade do tigre), que na época foram apenas cinco pessoas.
Para dominar este wicha na época era necessária a exposição à tigres selvagens e sentar sobre eles sem que causassem mal ou se enfurecessem. Hoje ainda existe este tipo de magia, mas não sei se a prática ainda continua como era antes.
Ajarn Best sabia que combates mágickos e todo tipo de mago invejoso era comum naquela época, ele se precavia mas o que temia mesmo era a influência de forças negativas de inimigos que ele trazia do astral. Por isso ele dormia com instrumentos mágickos necromânticos, entre eles dois crânios de espíritos protetores que o guardavam dia e noite.
A última predição de Ajarn Best
Foi ainda no primeiro semestre de 2012 que Ajarn Best, que era famoso por predizer coisas do futuro e da intimidade de quem nunca havia visto antes, fez a sua última previsão que chocou discípulos, mestres e admiradores.
Certo dia reuniu seus poucos discípulos e disse que em um mês (após exatos 31 dias) ele partiria de volta ao reino espiritual em determinada hora. Isso chocou à todos já que ele estava em plena saúde e juventude, além de dominar a magia da invencibilidade.
Exatamente como previsto, um mês depois, na hora falada, Ajarn Best pegou uma carona em um carro que sofreu um acidente brutal onde todos os envolvidos morreram na hora, inclusive ele próprio.
Alguns dizem que ele tinha 28 anos, outros que tinha 22. A idade, como dito, é alvo de debate, mas o mais provável é que ele tivesse 28 anos mesmo, pois alguém com 22 dificilmente conseguiria fazer o número de viagens, peregrinações e ter o número de mestres que Ajarn Best teve ao longo da vida.
Ele não era casado e tinha poucos amigos próximos, mas deixou o mundo um pouquinho menos interessante e fantástico. Poucos sabem dele hoje em dia, mesmo na Tailândia, já que ele fez poucas peças e nunca se envolveu de fato no mercado mágicko que existe aqui na Ásia.
Este pequeno artigo, o primeiro em português e provavelmente o mais completo de toda internet até hoje, é uma pequena homenagem ao espírito de Ajarn Best. Um prodígio da magia oriental.